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Curiosidades literárias

8 poemas escritos por mulheres que você precisa ler hoje

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Luise Spieweck Fialho | Redatora
Luise Fialho

Criamos a coleção Omitidas indômitas, uma pequena seleção de grandes mulheres da literatura de língua portuguesa que celebra dois movimentos – o da poesia e o das mulheres. Francisca Júlia, Florbela Espanca, Júlia Lopes de Almeida, Nísia Floresta, Josefina Álvares de Azevedo e Auta de Souza compartilham um esquecimento dos manuais literários, embora sua relevância no cenário poético seja notória. Abaixo, você encontra oito poemas escolhidos especialmente pela TAG para que possa conhecer seis poetisas e um pouquinho das suas obras.

Lembre-se de compartilhar o trabalho dessas importantes escritoras para que mais pessoas possam prestigiá-las. Boa leitura!

Musa Impassível

Musa! um gesto sequer de dor ou de sincero 

Luto jamais te afeie o cândido semblante!

Diante de Jó, conserva o mesmo orgulho; e diante

De um morto, o mesmo olhar e sobrecenho austero.

Em teus olhos não quero a lágrima; não quero

Em tua boca o suave e idílico descante.

Celebra ora um fantasma anguiforme de Dante,

Ora o vulto marcial de um guerreiro de Homero.

Dá-me o hemistíquio d’ouro, a imagem atrativa;

A rima, cujo som, de uma harmonia crebra,

Cante aos ouvidos d’alma; a estrofe limpa e viva;

Versos que lembrem, com seus bárbaros ruídos,

Ora o áspero rumor de um calhau que se quebra,

Ora o surdo rumor de mármores partidos.

Francisca Júlia da Silva

Os Argonautas

Mar fora, ei-los que vão, cheios de ardor insano;

Os astros e o luar — amigas sentinelas —

Lançam bênçãos de cima às largas caravelas

Que rasgam fortemente a vastidão do oceano.

Ei-los que vão buscar noutras paragens belas

Infindos cabedais de algum tesouro arcano…

E o vento austral que passa, em cóleras, ufano,

Faz palpitar o bojo às retesadas velas.

Novos céus querem ver, miríficas belezas,

Querem também possuir tesouros e riquezas

Como essas naus, que têm galhardetes e mastros…

Ateiam-lhes a febre essas minas supostas…

E, olhos fitos no vácuo, imploram, de mãos postas,

A áurea bênção dos céus e a proteção dos astros…

Francisca Júlia da Silva

Francisca Júlia da Silva nasceu na capital paulistana em 1871 e era conhecida como a “musa impassível”. Além de colaborar como jornalista para diversos veículos da época, publicava poemas e acreditava na necessidade do desenvolvimento da literatura destinada às crianças. João Ribeiro, crítico literário da época, duvidava que seus versos pudessem ser creditados a uma mulher. Quando descobriu a verdadeira autoria, impulsionou a publicação do primeiro livro de Francisca Júlia, Mármores (1895). Seu estilo literário voltava-se para um eu-lírico objetivo, rigoroso e, ao mesmo tempo, simbolista e místico. Victor Brecheret a homenageou após seu falecimento com a estátua Musa Impassível que hoje encontra-se na Pinacoteca de São Paulo.

Primavera

É Primavera agora, meu Amor!

O campo despe a veste de estamenha;

Não há árvore nenhuma que não tenha

O coração aberto, todo em flor!

Ah! Deixa-te vogar, calmo, ao sabor

Da vida… não há bem que nos não venha

Dum mal que o nosso orgulho em vão desdenha!

Não há bem que não possa ser melhor!

Também despi meu triste burel pardo,

E agora cheiro a rosmaninho e a nardo

E ando agora tonta, à tua espera…

Pus rosas cor-de-rosa em meus cabelos…

Parecem um rosal! Vem desprendê-los!

Meu Amor, meu Amor, é Primavera!…

Florbela Espanca

Amor que morre

O nosso amor morreu… Quem o diria!

Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta.

Ceguinha de te ver, sem ver a conta

Do tempo que passava, que fugia!

Bem estava a sentir que ele morria…

E outro clarão, ao longe, já desponta!

Um engano que morre… e logo aponta

A luz doutra miragem fugidia…

Eu bem sei, meu Amor, que pra viver

São precisos amores, pra morrer

E são precisos sonhos pra partir.

Eu bem sei, meu Amor, que era preciso

Fazer do amor que parte o claro riso

Doutro amor impossível que há de vir!

Florbela Espanca

Florbela Espanca, nascida Flor Bela Lobo em 1894, foi uma poetisa feminista portuguesa. Conhecida pelas suas transgressões que chocaram o início do século XX – casou-se três vezes, frequentava bares e foi a primeira mulher a ingressar no curso de Direito da Universidade de Lisboa –, escreveu seu primeiro poema com apenas 8 anos de idade. Sobre sua poesia, marcada por temas subjetivos, como amor, solidão, sofrimento e desamores, Florbela dizia ter “uma sede de infinito”. Essa sede a fez publicar contos, um diário, inúmeras traduções e somente duas antologias de poemas, número suficiente para tê-la colocado no mapa literário dos principais autores portugueses.

A laranjeira

Perfumada laranjeira,

Linda assim dessa maneira,

Sorrindo à luz do arrebol,

Toda em flores, branca toda

– Parece a noiva do Sol

Preparada para a boda.

E esposa do Sol, que a adora,

Com que cuidados divinos

Curva ela os ramos, agora!

E entre as folhas abrigados,

Seus filhos, frutos dourados,

Parecem sois pequeninos.

Júlia Lopes de Almeida

Júlia Lopes de Almeida nasceu no Rio de Janeiro, em 1862. Aos dezenove anos, começou a trabalhar na imprensa, em uma época que as mulheres não costumavam ocupar esses espaços. Em seguida, colaborou com diversos periódicos, publicou contos, poemas e seu primeiro romance, Memórias de Marta, em 1888. Além da sua expressão nas letras, era defensora fervorosa da causa abolicionista, da educação às mulheres e do divórcio. A autora estava entre os intelectuais que participaram da criação da Academia Brasileira de Letras, cujo assento número três pertenceu ao seu marido. No entanto, como o ingresso era vetado às mulheres, Júlia foi impedida de postular sua candidatura, apesar de muitos críticos da época considerarem-lhe literariamente superior aos colegas imortais.

A Lágrima de um Caeté (Fragmento)

Era da natureza filho altivo,

Tão simples como ela, nela achando

Toda a sua riqueza, o seu bem todo…

O bravo, o destemido, o grão selvagem,

O brasileiro era… – era um Caeté!

Era um Caeté, que vagava

Na terra que Deus lhe deu,

Onde Pátria, esposa e filhos

Ele embale defendeu!…

É este… pensava ele,

O meu rio mais querido;

Aqui tenho às margens suas

Doces prazeres fruído…

Aqui, mais tarde trazendo

Na alma triste, acerba dor,

Vim chorar as praias minhas

Na posse de usurpador!

Que de invadi-las

Não satisfeito,

Vinha nas matas

Ferir-me o peito!

Ferros nos trouxe,

Fogo, trovões,

E de cristãos

Os corações

E sobre nós

Tudo lançou!

De nossa terra

Nos despojou!

Tudo roubou-nos,

Esse tirano,

Que povo diz-se

Livre e humano!

Nísia Floresta

Nísia Floresta era o pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto, nascida em 1810, na cidade de Papari, Rio Grande do Norte, que atualmente leva seu nome. Nísia é considerada a primeira feminista brasileira e latino-americana, pois foi precursora em diversos campos ligados à emancipação das mulheres. Seu primeiro livro, Direitos das mulheres e injustiças dos homens, publicado em 1832, foi o passo inicial em direção a um caminho sedimentado pela defesa dos direitos das mulheres, indígenas e escravos. Aos 28 anos, abriu a primeira escola para meninas no Brasil, onde ensinava gramática, música, francês e matemática, contrariando as outras instituições que focavam na costura, boas maneiras e cozinha.

Ao rugido medonho da tormenta

Que a alma nos esmaga, nos trucida,

Não pensem que maldigo a triste vida

Nem o sopro de Deus que ora me alenta

Nem um momento só sou esquecida

De quem criou o mundo e aviventa

A flor do prado, a fera mais cruenta,

A tudo, enfim, que tem ou não tem vida

É doce nas agruras da existência

Lembrarmos a divina onipotência,

Erguermos para o céu o coração!

Naquele terno enlevo de fé pura

É sempre mui feliz a criatura

Que forças vai buscar no coração.

Josefina Álvares de Azevedo

Josefina Álvares de Azevedo nasceu em 1851, em Recife. Fundadora do periódico paulista A Família (1877) foi jornalista, escritora, professora e feminista. A gazeta, que defendia o sufrágio universal, era voltada à publicação de autoras e à educação das mulheres brasileiras. Conhecida por criticar a Igreja Católica em seus poemas e artigos, a escritora atentava também para os temas que tratavam especificamente sobre a condição das mulheres comuns, donas de casa, mães e trabalhadoras. A Família contava com colaboradoras internacionais que, segundo o desejo de Josefina, deveriam unir-se e apresentar as conquistas feitas em seus países, como França e Inglaterra, compartilhando lutas e desafios.

Noites amadas

Ó noites claras de lua cheia!

Em vosso seio, noites chorosas,

Minh’alma canta como a sereia,

Vive cantando n’um mar de rosas;

Noites queridas que Deus prateia

Com a luz dos sonhos das nebulosas,

Ó noites claras de lua cheia,

Como eu vos amo, noites formosas!

Vós sois um rio de luz sagrada

Onde, sonhando, passa embalada

Minha Esperança de mágoas nua…

Ó noites claras de lua plena

Que encheis a terra de paz serena,

Como eu vos amo, noites de lua!

Macaíba – Agosto de 1898.

Auta de Souza

Auta de Souza foi um poetisa mística da segunda geração romântica, isto é, próxima do período literário conhecido como Mal do Século. Nascida em 1876 na cidade de Natal, foi criada pela avó materna e estudou em um colégio de freiras, onde teve a oportunidade de aprender inglês, latim, francês e muita literatura religiosa. Seu único livro de poemas, Horto (1900) começou a ser escrito na altura dos seus 16 anos, logo após receber o diagnóstico de tuberculose. Mesmo tendo utilizado pseudônimos masculinos para ser publicada em jornais da época, venceu a resistência de um meio que era dominado por homens e consagrou-se como uma das principais poetisas de sua geração.

Quer ler mais poemas escritos por mulheres? Conheça a coletânea Rua Aribauque une a escrita de 15 autoras, como Jarid Arraes e Angélica Freitas, às ilustrações de 15 artistas.

4.7/5 - (25 avaliações)

20 comments

  • Que beleza de poesias !!! Adorei lê-las, tomar conhecimento das outras todas exceto Florbela Espanca.
    Obrigada TAG por mais esta surpresa.

  • É fantástico esse blog. A TAG é uma fantástica. Sou novo por aqui e ainda estou experimentando tudo. E digo é melhor que sorvete.

  • Ótimo, porém im-per-do-á-vel a omissão da magnífica Cecília Meireles, a maior poetisa da língua portuguesa de todos os tempos e um dos maiores poetas – agora no masculino – de nossas letras.

    • Oi, Sinéder! A ideia dessa seleção foi evidenciar o trabalho de mulheres que compartilham um esquecimento dos manuais literários, por isso a ausência de Cecília Meirelles! Concordamos com você sobre a importância da poeta – inclusive, somos muito fãs dela por aqui <3

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