Ler histórias que dialogam com nossa época ajuda a gente a entender e se relacionar melhor com a diversidade e a complexidade do mundo, perto ou longe das nossas referências. Do íntimo ao coletivo, a literatura contemporânea revela descobertas valiosas sobre nós mesmos, sobre as histórias que vivemos e que nos atravessam.
Em agosto, tivemos o privilégio de enviar aos associados da TAG Curadoria (assine aqui!) o novo romance de um dos maiores escritores italianos da atualidade, Domenico Starnone. Indicado por Maria Bopp, Línguas é o quinto livro do autor publicado no Brasil.
Conectar leitores a grandes autores está no cerne do propósito da TAG, e muitos nomes geniais já passaram pelas nossas caixinhas. Fizemos uma seleção de dez escritores para você conhecer, relembrar ou mergulhar mais fundo!
1. Domenico Starnone
Nascido em 1943, em Nápoles, o escritor italiano é autor de mais de uma dezena de romances, além de roteiros, peças de teatro e artigos. Após três décadas lecionando em escolas, publicou seu primeiro livro já maduro, aos 42 anos. Em 2001, foi reconhecido com o Prêmio Strega, o mais prestigioso da literatura italiana, mas seus livros só chegaram ao Brasil em 2017 pela Todavia, que publicou Laços, Assombrações, Segredos e Dentes.
São obras curtas e envolventes, com narradores homens, mais velhos, cultos, revisitando fantasmas do passado e que vivem na mesma cidade onde o autor nasceu. Em narrativas que se entrelaçam com a história de Starnone, o dialeto napolitano tem sempre seu lugar, mas no seu novo romance, ele presta uma verdadeira homenagem à memória desta língua – que, segundo a Unesco, está atualmente ameaçada, usada apenas como idioma oral em situações informais.
Nas páginas de Línguas, um menino na Nápoles do pós-guerra passa os dias sonhando com poesia e contemplando uma menina que, no tão-perto-tão-longe do prédio da frente, dança destemida no parapeito da sacada. Entre a delicadeza inocente de um amor de infância e alguma clareza que o narrador tateia ao revisitar o passado, o protagonista navega o mundo e suas memórias equilibrando seus sentimentos, obsessões e traumas, temas ideais para colocar à mesa conversas que reverberam além da história em si. Starnone convida a olhar para a riqueza simbólica, a profundidade e o caráter decisivo dos detalhes aparentemente banais das histórias que contamos, mas que carregam em si universos inteiros.
“Línguas” foi enviado em agosto de 2024 pela TAG Curadoria.
2. Brenda Navarro
Socióloga e especialista em direitos humanos, a escritora mexicana é dona de uma prosa visceral que, ao mergulhar no universo íntimo de personagens vivendo situações dramáticas, toca de forma ao mesmo tempo certeira e sensível em temas do nosso tempo. Autora de contos e poemas, Brenda Navarro ganhou o Prêmio Tigre Juan por Casas vazias, seu romance de estreia. Seu livro mais recente, Cinzas na boca, foi reconhecido com o Prêmio Cálamo.
Em Casas vazias, a autora costura habilmente vozes narrativas distintas, marcadas pelo ponto de vista de duas mulheres anônimas, por seus traumas e por suas angústias. Os relatos, em toda sua crueza, trazem à tona os diferentes modos como elas experienciam o mesmo episódio, o desaparecimento de um menino de três anos, e levantam reflexões sobre estereótipos associados à maternidade. Ela lança um olhar afiado para problemas sociais como a desigualdade econômica, a violência contra a mulher e o capacitismo.
Navarro é também fundadora do Enjambre Literario, projeto que busca formar uma rede de escritoras e jornalistas ibero-americanas e promover a escrita de mulheres.
“Creio que é esse o poder da literatura: que uma história ficcional tenha a capacidade de fazer esses questionamentos que rompem a dicotomia do bem ou do mal e levam a humanidade à sua justa dimensão. Não há bem ou mal. Há intenções, desejos frustrados e relações de poder.”
Casas vazias foi enviado em maio de 2022 pela TAG Curadoria.
3. Elif Shafak
Nascida na França em 1971, a premiada romancista britânico-turca é PhD em Ciência Política e doutora em Humanidades, e deu aulas em universidades na Turquia, nos Estados Unidos e no Reino Unido. Com narrativas que colocam em evidência conflitos históricos e tradições culturais, Elif Shafak ganhou repercussão internacional, teve suas obras traduzidas para mais de 50 idiomas e foi finalista de prêmios como o Booker Prize e o Women’s Prize.
Defensora dos direitos das mulheres, LGBTQ+ e da liberdade de expressão, a escritora é também uma palestrante pública inspiradora, tendo participado duas vezes do TED Global.
No romance A ilha das árvores perdidas, ela apresenta de forma poética e pouco convencional a história de uma garota que busca desvendar o passado de seus pais, um casal que migrou do Chipre, ilha dividida por um conflito étnico, para viver em Londres. Levada com eles para o território inglês, uma figueira é a testemunha dessa história. Uma narrativa histórica sobre o luto e a memória coletiva, marcada por com um lirismo surpreendente e contagiante.
“Acho que é isso que a literatura faz – trazer a periferia para o centro, empoderar os desempoderados, reumanizar aqueles que foram desumanizados e dar voz aos silêncios e aos silenciados.”
A ilha das árvores perdidas foi enviado em setembro de 2022 pela TAG Curadoria.
4. Socorro Acioli
Fortaleza, 1975. Nascia então a escritora e jornalista Socorro Acioli. Autora de uma das obras mais sólidas e engenhosas do cenário nacional, a cearense é doutora em Literatura pela Universidade Federal Fluminense, professora e coordenadora da especialização em Escrita e Criação da Universidade de Fortaleza. Escreveu e publicou mais de 20 livros, entre eles Ela tem olhos de céu, que ganhou o Jabuti de literatura infantil, a coletânea de poemas Takimadalar, as ilhas invisíveis, e os romances A cabeça do santo e Oração para desaparecer, que a consolidou nas histórias que surgem de fatos reais e que têm como inspiração a religiosidade brasileira popular usada para fomentar elementos de realismo mágico e fantasia.
Oração para desaparecer narra a história de Cida, uma mulher sem identidade nem memória, que deve reconstruir pouco a pouco uma nova vida em um lugar completamente desconhecido. Bebendo da fonte de autores como Saramago, Socorro Acioli une Brasil e Portugal e destaca os temas da espiritualidade e da busca por identidade em uma trama sobre ancestralidade e pertencimento, inspirada pelas narrativas populares e pela religiosidade Tremembé.
“Oração para desaparecer” foi enviado em setembro de 2023 pela TAG Curadoria.
5. Mia Couto
Vencedor do Prêmio Camões, o moçambicano filho de imigrantes portugueses é o escritor mais traduzido de seu país. Biólogo de formação e prática, aventurou-se no jornalismo, mas encontrou sua vocação definitiva na literatura. Tornou-se um dos autores contemporâneos mais importantes da literatura de língua portuguesa e é o único escritor africano membro da Academia Brasileira de Letras. Autor de dezenas de livros, Mia Couto tece uma prosa poética única que aborda de forma a um só tempo arrebatadora e delicada a memória africana e as marcas do colonialismo português no continente.
Em O mapeador de ausências, Mia Couto remete a si mesmo na figura de Diogo Santiago, um intelectual, escritor e filho de poeta que volta à cidade da Beira para receber uma homenagem. Na viagem, busca também um reencontro com o passado, apagado desde sua mudança para a capital. Lá, sua jornada encontra a de outra personagem e suas histórias se entrelaçam à história de Moçambique, em relatos sobre o processo de independência do país e os conflitos sociais que resistem ao tempo.
O mapeador de ausências foi enviado em julho de 2021 pela TAG Curadoria.
6. Mariana Salomão Carrara
Uma das autoras de maior destaque da literatura brasileira contemporânea, a escritora e defensora pública se destaca tanto pela sensibilidade de criar vozes fortes e convincentes, quanto pela importância de seus temas, que passam por questões de identidade, memória, relações familiares, espiritualidade e morte.
Nas páginas de seu primeiro romance, Se Deus me chamar não vou, Mariana conta a história de uma menina desajeitada que demora a encontrar seu lugar no mundo, entre uma insegurança brutal e uma vontade imensa de fazer sua vida dar certo. Em É sempre a hora da nossa morte amém, ela faz um mergulho profundo nas inquietações humanas sobre a nossa finitude, nossa precariedade e o processo de envelhecimento, em um exemplo impressionante de destreza narrativa. No arrebatador Não fossem as sílabas do sábado, vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura, uma mulher tem que conviver ao mesmo tempo com a notícia de uma gravidez inesperada e a aceitação do luto pelo marido recém-morto.
Em A árvore mais sozinha do mundo, Mariana reinventa modos de narrar e surpreende até os leitores mais próximos de sua obra ao adotar perspectivas nada usuais. A árvore do jardim e o espelho português da sala de estar são alguns dos narradores dessa história sobre uma família de agricultores no Sul do Brasil e sua relação com a terra.
A árvore mais sozinha do mundo foi enviado em julho de 2024 pela TAG Curadoria.
7. Carola Saavedra
Chilena, radicada no Brasil e vivendo atualmente na Alemanha, Carola Saavedra é uma das escritoras mais prestigiadas da literatura brasileira contemporânea. O mosaico de referências e experiências culturais no trânsito territorial da autora transborda para seus livros, resultando em uma obra inventiva, tocante e original.
Seu quinto romance, Com armas sonolentas, é uma narrativa marcada pela atmosfera onírica, insinuada já no título. A obra gira em torno da trajetória de três mulheres que buscam o seu lugar no mundo, vivenciando o abandono e o exílio e unidas pela ancestralidade. Uma série de referências e elementos simbólicos compõe a trama, que desafia classificações. Com uma escrita marcada pela intertextualidade, a autora entrega uma obra surpreendente, considerada a mais madura de sua carreira.
“Estar em trânsito nos arranca o chão primordial, o que é terrível, mas, por outro lado, nos obriga a construir outra terra por onde caminhar. Um chão de palavras que, bem sabemos, é frágil e efêmero como tudo o que há. Talvez seja essa caminhada (instável, inquieta) o que transborda para a minha escrita.”
Com armas sonolentas foi enviado em agosto de 2022 pela TAG Curadoria.
8. Abdulzarak Gurnah
Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 2021, o escritor tanzaniano radicado em Londres foi descrito pela Academia Sueca como um autor “avesso a simplificações”. Nascido em Zanzibar durante o domínio colonial britânico, Gurnah se viu obrigado a fugir da terra natal após a independência da Tanzânia, quando cidadãos de origem árabe passaram a ser perseguidos. Na Inglaterra, o escritor se tornou professor na Universidade de Kent e é um importante intelectual para os estudos pós-coloniais, além de ser um dos principais especialistas na obra de Salman Rushdie. O deslocamento forçado é um tema central em suas obras.
À beira-mar (2001), o sexto romance do autor, acompanha um ex-comerciante de Zanzibar que assume a identidade de um conhecido e busca, em idade avançada, asilo político na Inglaterra. O romance alterna entre o presente, em uma paisagem nova e desconhecida, e o passado, na terra natal arrasada por conflitos de ordem política – embora a nação que o acolhe possa se mostrar ainda mais inóspita. A narrativa explora os pontos de vista de dois homens sobre conflitos familiares do passado, em uma trama que une habilmente episódios pessoais e eventos históricos ligados ao colonialismo na África Oriental. Os personagens do livro estão envoltos em relações complexas, e nada do que ocorre na trama nos sugere respostas imediatas.
“Acredito que a escrita também deve mostrar o que pode ser diferente, o que o olho duro e dominador não consegue ver, o que faz com que pessoas de aparentemente pequena estatura sintam-se seguras de si independentemente do desdém alheio.”
À beira-mar foi enviado em julho de 2022 pela TAG Curadoria.
9. Javier Cercas
Um dos escritores espanhóis mais celebrados da contemporaneidade, Javier Cercas teve seus livros traduzidos para 30 idiomas. Nascido na pequena cidade de Ibahernando, em 1962, Cercas mudou-se ainda criança para Girona. Descendente de uma família de ambos os lados franquista, tem a “fronteira entre a moral e a política” no cerne de seus livros, onde cabem elementos do ensaio, crônica, ficção e não ficção.
Publicado em 2001, o romance Soldados de Salamina elevou Cercas ao grupo dos grandes escritores da atualidade. Com mais de um milhão de exemplares vendidos e elogios de escritores como Mario Vargas Llosa e Susan Sontag, a obra demarcou características fundamentais do estilo que o autor desenvolveria ao longo dos anos: um complexo diálogo entre o histórico e o fictício, personagens reais ficcionalizados e um narrador homônimo que se confunde com o próprio autor.
Em A velocidade da luz, um jovem aspirante a escritor na Espanha dos anos 80 é convidado para lecionar em uma cidade no interior dos Estados Unidos e tem sua vida permanentemente transformada pelo encontro com um veterano da Guerra do Vietnã que guarda marcas brutais dessa experiência. A complexa e tumultuada relação entre os dois é o cerne dessa obra. Uma forte narrativa sobre amizade, partilha, dor e a importância de contar as histórias que parecem não caber em palavras.
“Quando escrevo um livro é para solucionar um problema que coloquei a mim próprio, como um teorema. Ou seja, por perplexidade. Claro que, no final, não há solução. Ou melhor, a solução é o próprio processo do romance. Porém o essencial escapa-nos sempre.”
A velocidade da luz foi enviado em janeiro de 2019 pela TAG Curadoria.
10. Marta Orriols
Dona de uma prosa sensível, fluida e intensa, a catalã Marta Orriols é uma escritora para conhecer e ficar de olho. Seu primeiro livro, Anatomía de las distancias cortas, foi um sucesso de crítica e público, e sua estreia no romance, Aprender a falar com as plantas, ganhou o Prêmio Omnium de Melhor Romance do Ano, com traduções em diversos países.
No livro, a protagonista se depara com um perturbador e ambíguo dilema: horas antes de morrer em um acidente, seu marido revela que a deixaria para viver com outra mulher. Paula Cid, médica bem-sucedida, vê seu mundo desabar. A trama explora o modo como ela reage ao episódio e dá sequência à sua vida, traçando pistas aos leitores para desvendar a densa floresta interior da protagonista, seus tormentos e anseios. Como uma boa obra contemporânea, a história traz questões caras ao nosso tempo, para além da dor da perda.
Neste ano, Marta Orriols publicou seu segundo romance, Doce introdução ao caos, uma narrativa que também se debruça sobre desejos e dilemas caros ao nosso tempo com profundidade e destreza narrativa. A trama mergulha na jornada emocional de um casal que se depara com uma gravidez que ele deseja continuar e ela deseja interromper.
Aprender a falar com as plantas foi enviado em outubro de 2021 pela TAG Curadoria.
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