Por que ler autores Trans?
Há muitas formas sutis de desumanizar uma pessoa ou um grupo social. Narrar pessoas trans apenas pela lente da dor e da precariedade pode ser uma forma de sustentar as estruturas que limitam sua experiência no mundo. É preciso afirmar as múltiplas dimensões de existências que desviam da norma social. Ler e escutar histórias em que transsexuais, travestis e pessoas não binárias falem de si e sejam representadas em toda complexidade que envolve a experiência humana – graça, dor, sonhos, frustrações, desejos, autoestima e amparo afetivo.
Se ler é uma forma de alargar nosso olhar, buscar ativamente a diversidade nos autores, territórios e protagonistas que constituem as histórias que lemos é um movimento que nos prepara tanto para lidar melhor com a diferença quanto para encontrar profundas semelhanças com sujeitos que, à primeira vista, não parecem parecer com a gente.
Há 15 anos, o Brasil é o país que mais mata pessoas trans em todo o mundo. Mas essa não é e não pode ser a única narrativa que conhecemos sobre uma população que reivindica a partir do próprio corpo o direito de vivenciar sua identidade de gênero. Convidamos você a mergulhar em histórias que percorrem o universo multifacetado de existências trans através de protagonistas inesquecíveis.
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Elvis e Madona: uma novela lilás, Luiz Biajoni
Uma história cativante e divertida que mistura romance e trama policial, narrando o relacionamento entre a travesti Madona e a motogirl lésbica Elvis. Ambientado em Copacabana, o livro foi publicado originalmente em 2010, junto com o filme homônimo de Marcelo Laffitte. Em 2021, ganhou uma edição especial comemorativa de dez anos. Uma obra fundamental na reinvenção do imaginário LGBTQIA+ no Brasil, com prefácio de Amara Moira e posfácio de Raphael Montes.
Nada digo de ti, que em ti não veja, Eliana Alves Cruz
No Rio de Janeiro do século 18, os dilemas sociais saltam aos olhos do leitor por se parecerem muito com os do século 21. Neste romance histórico da premiada escritora brasileira, ela apresenta uma trama envolvente marcada por uma personagem forte, corajosa e inesquecível: Vitória, uma mulher negra transexual que vive um amor proibido com o filho de uma família rica. A edição tem apresentação de autoria da atriz e poetisa Elisa Lucinda.
O parque das irmãs magníficas, Camila Sosa Villada
Uma trama inspirada na trajetória da própria autora, travesti que saiu do interior da Argentina para ganhar a vida em Córdoba. O livro vai além de um relato autobiográfico. As aventuras e desventuras da protagonista ganham a forma de um romance potente, marcado por uma engenhosa construção formal, com personagens surpreendentes e doses de um realismo mágico único.
Água doce, Akwaeke Emezi
Narrada na primeira pessoa do plural, a história de uma criança nigeriana que vive com vários seres dentro de si. Em uma jornada marcada pela incompreensão da família e ameaçada pela loucura, ela aprende a conviver com os espíritos que a constituem e a abraçar uma existência ogbanje – sem gênero e sem extremos, múltipla. Autobiografia ficcionalizada e livro de estreia de Akwake Emezi, Água doce foi nomeado Livro Notável pelo New York Times.
Orlando, Virginia Woolf
Um aristocrata inglês que vive durante séculos acorda certo dia com um corpo feminino. A elasticidade do tempo, a fluidez da identidade sexual e a experiência subjetiva de gênero em uma obra que é histórica, íntima e fantástica. Narrada no estilo provocativo e poético de uma das maiores escritoras do século 20.