Entrevista: Mariana Enriquez e "Uma casa no fim do mundo" de Michael Cunningham - Blog da TAG
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Entrevista: Mariana Enriquez e “Uma casa no fim do mundo” de Michael Cunningham

Mariana Enriquez. Foto: Louise Oligny Share this post

Em dezembro, os associados da TAG Curadoria receberam Uma casa no fim do mundo, de Michael Cunningham indicação de Mariana Enriquez para o clube. A escritora e jornalista argentina, inspirada por Stephen King, Edgar Allan Poe e tantos outros, faz do terror e do fantástico gêneros dos quais pulsam, sutil ou explicitamente, elementos de uma realidade sombria.

Mariana, hoje com 46 anos, foi expoente de um interessante revival do gênero fantástico/terror na literatura argentina junto com autores como Samanta Schweblin. Esse interesse renovado também impulsionou traduções de escritores como Sara Gallardo e Hebe Uhart para o inglês, que ainda estão para chegar a terras brasileiras. Publicando desde 1994, Enriquez se tornou conhecida pelos leitores brasileiros somente há alguns anos: As coisas que perdemos no fogo (2016), coletânea de contos macabros, foi sua primeira obra traduzida para o português.

A certeza do terror em tempos incertos e a honradez de uma lápide se misturam na fala da curadora do mês de dezembro. Em entrevista por e-mail, Mariana Enriquez respondeu a perguntas sobre o mito da “temática feminina” na literatura e sobre sua relação com Uma casa no fim do mundo, livro que indicou para os assinantes da TAG. Leia a íntegra da conversa:

TAG – Como você acha que o gênero de terror tem se modernizado na literatura contemporânea? Quando surgiu o seu interesse nesse gênero?

Mariana Enriquez – Penso que cada vez mais o terror contemporâneo é um gênero capaz de falar sobre tudo, uma meta de gênero: pode ser um terror social, político, relacionado ao corpo, com traumas, com o sobrenatural. O gênero é muito apropriado para tempos de incerteza como estes que vivemos – também se aproxima cada vez mais do literário, com muitos escritores falando de realidades distópicas. Meu interesse surgiu quando criança, lendo sobretudo Stephen King, e outros autores ou textos que não eram necessariamente “do gênero”, mas que me causaram a inquietação que procurava. Sempre foi uma busca agradável, estética e literária.

Os cemitérios são elementos frequentes em suas histórias. Por que esse fascínio? Qual é o seu cemitério favorito?

Mariana – Sempre me fascinaram como lugares tabu: a morte está tão escondida em nossas sociedades e temos tanto medo dela que, para mim, os cemitérios eram e são um lugar limite onde se enfrenta aquilo que dá medo não somente a mim, mas à maioria das sociedades do Ocidente. Além disso, na Argentina, a ditadura, que coincidiu com minha infância, assassinou, mas sumiu com os corpos. Então, para mim, um túmulo nomeado é um pouco reparador; o maior horror da história do meu país tem a ver precisamente com a ausência de um túmulo. Meu cemitério favorito vai mudando, mas neste momento é o Highgate, em Londres. Também gosto muito do cemitério Holt, em Nova Orleans, e o Azul, na província de Buenos Aires.

“Não acredito que exista literatura feminina.”

Você publicou seu primeiro livro quando tinha apenas 21 anos. Como você vê a importância do mercado editorial (latino-americano e mundial) para acomodar a literatura feminina?

Mariana – Eu tinha 21! Era muito jovem. Meu livro então foi publicado porque eu era jovem, e o que se buscava era um livro escrito por alguém jovem. Faz mais de 20 anos, mas a indústria não se preocupava com a literatura de mulheres. E digo de mulheres porque não acredito que exista literatura feminina: nós mulheres escrevemos e, em alguns casos, relatamos nossa experiência criativa, da qual pouco há registro em função de muitos anos de silenciamento, mas acredito que não há nenhuma essência, que uma mulher pode escrever sobre qualquer tema e que não existem temas específicos femininos. E quanto ao mercado, se nos dá lugar, temos que aproveitá- -lo. Todos os espaços que se abrem devem ser aproveitados.

Graças a você, 28 mil pessoas receberão Uma casa no fim do mundo em dezembro de 2019. O que você diria aos associados que lerão esta obra pela primeira vez?

Mariana – Que é um livro maravilhoso porque entende a família e os laços como algo fluido; é um romance triste, cheio de amor e com uma escrita absolutamente extraordinária e de grande beleza.

A estante de Mariana Enriquez

O primeiro livro que li: História sem fim, de Michael Ende

O livro que estou lendo: Murmur, de Will Eaves

O livro que gostaria de ter escrito: O morro dos ventos uivantes, de Emily Brontë

O último livro que me fez chorar: Cidades da planície, de Cormac McCarthy

O último livro que me fez rir: Meu ano de descanso e relaxamento, de Ottessa Moshfegh

O livro que não consegui terminar: Termino todos os livros, inclusive aqueles que detesto

O livro que dou de presente: O nervo ótico, María Gainza

O livro que mudou minha vida: O cemitério, de Stephen King

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